A VERDADE DIVIDIDA
A porta da verdade estava aberta
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.
Assim não era possível atingir toda a verdade
porque meia pessoa que entrava
só conseguia o perfil de meia verdade.
E a segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meio perfis não coincidiam.
Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia os seus fogos.
Era dividida em duas metades
diferentes uma da outra.
Chegou-se a discutir qual a metade era mais bela.
Nenhuma das duas era perfeitamente bela.
E era preciso optar. Cada um optou
conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia.
Carlos Drumond de ANDRADE, Contos Plausíveis. Rio de Janeiro, José Olympio, 1985. p.47.
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